Baixou os olhos para o fundo do
copo e viu sua bota pelo líquido amarelado, seu sorriso e olhos brilhavam com a
mentira que contava para si.
Chegou a casa imensamente
elétrica, quase convulsionando de tanta energia e quanto mais sorria menos
convencia. Suas pupilas dilatadas e cabelo desgrenhado exalavam todo o seu
descontrole.
Pediu um cigarro, acendeu,
desvairava-se pelos cantos e sentou-se. Sorria em demasia, mexia-se em demasia,
afirmava-se com exagero típico de quem precisa se convencer de suas "verdades".
Concordei com todas suas afirmações
sorrindo, verifiquei pupilas e questionei sobre ilícitos. Negou.
Talvez estivesse entorpecida
pelos próprios sentimentos que são tão alucinógenos quanto alguns cogumelos.
A doçura do seu sorriso e olhos
vidrados tranformaram-se dando-lhe traços felinos e afiados. Compreendi que a sua eletricidade era
um prelúdio ao ataque. Excitada como uma Naja
vibrava a cabeça para
acelerar o movimento do seu "esguicho de fel", assim cobrindo minha
incapacidade de prever e articular uma defesa.
Suas palavras atingiram
certeiramente o que poderia pressupor minhas capacidades neurais em reagir,
paralisando e interrompendo a comunicação entre meus nervos e músculos. O
sorriso ainda pairava debilmente no rosto e apenas os olhos poderiam expressar
quaisquer resquícios deste golpe.
Levantou-se e refugiou-se em seu
abrigo pseudo-abstrato fechando a porta mais uma vez.
Imóvel vibrava ódio e sentia cada
célula recebendo meu oxigênio e trocando por carbono, seu ataque paralisava a capacidade expressiva, embora avessamente sentia-me lucida.
Respirava com plenitude,
aspirando e expirando maiores quantidades de ar e silenciei. Fechei os olhos
por breves segundos e iniciei um processo reverso, deixando as energias
exalarem pelos poros e retrocedi seu veneno. Serenei.
Sorri novamente e
compreendi a quão ferida está, a quão dolorida e frágil encontra-se. As investidas
incessantes ao longo deste convívio, deixaram que meu corpo crie reações diferentes do que
seria esperado por você.
Enquanto busca regenerar-se
em sua essência, transforma suas intenções em frente ao espelho treinando debilmente aquela expressão de desespero e necessidade de amparo que lhe serve de isca para tolos como eu.